Por Arlindo Montenegro
No ano de 1946, meu irmão mais velho chegou de férias. Ele trabalhava em São Paulo e chegou guiando um automóvel, coisa rara naquelas estradas de terra que ligavam a fazendinha da roça à capital. O fordinho subiu a ladeira bufando e buzinando. Parou na sombra da jaqueira e ficou alí, exposto à curiosidade dos colonos, filhos e mulheres. Ninguém dalí havia chegado tão perto, ao ponto de tocar num "bicho" daqueles.
No domingo a turma fez fila para dar uma volta no automóvel, que dava partida com auxílio de uma manivela enfiada num buraco na parte dianteira. Daí esquentava e ficava ligado em ponto morto, tremendo desesperado, acho que pensando que nem meu irmão: tenho de agradar a caipirada, mas quero acabar depressinha.
Em 1951, ele chegou com um jeep land rover, mas aí não tinha mais graça. Todos já conheciam e haviam experimentado a emoção de andar de carro, caminhão, marinetti e trem. As crianças já eram adolescentes, estudavam e conheciam gelo e picolé.
Algumas conheciam até o cinema, uma novidade trazida pelos padres da santa missão, para mostrar dois filmes – A Vida, Paixão e Morte de N.S. Senhor Jesús Cristo e A Vida de São Francisco de Assis - projetados num lençol de casal branco, pregado no oitão da igreja. Quem viu, chorou, sorriu, emocionou e espantou-se. Foi conversa que durou muito tempo.
O Brasil rural, exportador de café, um país cristão e conservador, era alinhado aos EUA, a maior potência mundial, com ogivas nucleares prontas para rebater um ataque dos comunistas da União Soviética. Mas a gente sabia, intuitivamente, que tais ogivas não seriam utilizadas. A experiência de Hiroshima e Nagasaki era muito dolorosa e recente. Getulio o ditador, o pai dos pobres, o criador dos sindicatos o eleito e aclamado, era um estadista.
No dia 24 de Agosto de 1954, suicidou-se. A nação brasileira ficou traumatizada, ouvindo ou lendo a "Carta testamento" em que denunciava as pressões políticas que sofria. Morria deixando uma base normaativa institucional e investimentos de base como a CSN, a Vale do Rio Doce, a CHESF bem como o IBGE. Instituiu as Leis Trabalhistas e a CLT. Foi sem dúvida um dos mais importantes Estadistas brasileiros.
Juscelino Kubstcheck foi eleito e o Brasil viveu 5 anos de intermezzo democrático, com o pleno emprego gerado pela construção de Brasília para onde afluíram brasileiros de todos os recantos. Os "candangos" trabalharam exaltados por ardor patriótico, enquanto em São Paulo se instalavam as empresas automobilísticas, gerando milhares de empregos. Os três poderes da república funcionavam em harmonia e os oposicionistas se manifestavam livremente, apostando que a construção de Brasilia fracassaria.
Em 1956 chegou a primeira geladeira americana, uma "Frigidaire" com o pinguim , aquele bicho estranho lá em cima. Minha irmã casou e mamãe dividiu com ela o aparelho de porcelana inglesa e os cristais. Na igreja descobrimos que o padre cobrava por cada porta lateral aberta, por cada vela acesa, pela passadeira estendida e pelas flores. Papai disse que estava certo, quem não pudesse pagar podia casar na santa missão que era de graça.
Para quem migrou do Brasil rural, presenciou o fortalecimento de empresas de capital nacional com o impulso facilitado por Vargas, no pós guerra; para quem presenciou o entusiasmo e o clima de liberdade durante os anos do governo de Juscelino, construtor de Brasília e fomentador da indústria automobilística, os sustos e mudanças posteriores, com Janio e com Goulart, foram marcantes. A nação passou a conviver com a insegurança institucional e a instabilidade das greves.
A guerra fria mantinha o mundo atemorizado, as guerrilhas que até então estavam espalhadas pelo continente africano, começaram a surgir na América Latina: Venezuela, Colombia, Peru. Mas entre nós havia uma imprensa livre e os grandes jornais informavam e o rádio era o veículo ao alcance de quase todos os brasileiros. A televisão era um privilégio dos lares mais endinheirados do Rio e São Paulo.
Em cinquenta anos a sucessão de mudanças foi de tal porte, a pressa foi tanta, uma vertigem! Novas tecnologias, variações filosóficas, debates acabados, idéias importadas. De certo modo, parecia que a gente dormia num país e acordava noutro. O que antes valia e guiava as decisões começaou a mudar e sofrer influências que pareciam coisa do capeta. Agora estamos vivendo num paradeiro infame. Nada se resolve no meio da gente. Tudo vem pronto por ordem do governo.
O governo integrado por comunistas, deixou de lado a cultura tradicional e as políticas de obediência às Leis, para alinhar a nação à escória da humanidade, tudo em nome de um arremedo democrático que não respeita nada, nem a dignidade de ninguém. Vivemos uma ditadura disfarçada que serve aos grandes bancos e empresas transnacionais. Nada que lembre o populismo de Getúlio ou Juscelino.
As "forças ocultas" referidas por Jânio Quadros ao renunciar, estão bem conhecidas e identificadas. Estão governando esta nação e querem perpetuar-se no poder, o que nos levaria ao regresso obscurantista, mais violento, mais vergonhoso. Os coveiros da liberdade e da civilização cristã estão mais ativos que nunca, calando toda a razão histórica.
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