Por Mary O´Grady
No dia 28 de Junho, Manuel Zelaya foi deposto da Presidência, por ato da Suprema Corte e do Congresso Nacional de Honduras, acusado de violentar a Constituição. O governo de Barak Obama insiste em dizer, sem base legal que o incidente equivale a um "golpe de Estado" e que deve ser revertido. Obama trata Honduras com dureza e os norteamericanos são chamados a confiar nas declarações de seu governante.
Um informe do Serviço de Investigação do Congresso dos EUA, disponível na Biblioteca daquela instituição, expõe uma versão legal e séria dos o que o governo Obama não previu: "As fontes disponíveis indicam que os poderes Judiciário e Legislativo de Honduras aplicaram o direito constitucional e estatutário no caso do afastamento de Zelaya, interpretando à risca o sistema legal hondurenho". O informe está firmado por Norma C. Gutierrez, especialista em Direito Internacional do Congresso dos EUA.
Por acaso faz diferença? Nem em sonho. A Casa Branca continua defendendo sua posição. Há dez dias a Secretária de Estado Hillary Clinton chegou a sancionar o Poder Judiciário de Honduras, o poder de uma nação independente.
As razões norte americanas não são explicitadas, mas fica claro que o pecado da Suprema Corte de Honduras é repelir o plano de restituir o poder a Zelaya, com o aval da Casa Branca.
Ou seja, os EUA querem obrigar Honduras a violar sua própria Constituição, utilizando o peso de sua política internacional para interferir no sistema judicial independente de outro país. Os hondurenhos estão preocupados com o impacto desta pressão internacional. A posição dos EUA libera a violência dos partidários de Zelaya, que tomam as ruas, causam destruição e intimidam a população. Cada vez que a polícia age, começam a gritar em defesa de "seus direitos humanos".
Os norte americanos deveriam preocupar-se mais com o autoritarismo, sem justificativa legal, que emana do poder executivo em Washington. O que é que Obama sinaliza acerca da separação de poderes, quando instrui a sua Secretária de Estado para castigar um tribunal independente que não recuou, como ele queria?
Os EUA estão pressionando Honduras desde 28 de Junho para que Zelaya volte ao poder. Mas nem os duvidosos argumentos esgrimidos por Hillary Clinton sobre o "império da Lei", nem as armas disponibilizadas por Obama para convencer a Justiça hondurenha a ignorar a Constituição do país, surtem efeito.
A Secretaria de Estado irritou-se, porque a Justiça hondurenha entendeu que a volta de Zelaya nos termos propostos pelo Presidente da Costa Rica, Oscar Arias, é inconstitucional. Por fim, o Departamento de Estado decidiu que, para defender o estado de direito, castigaria os membros da Corte Suprema de Honduras, por interpretar sua própria Constituição. E retirou os vistos dos 14 magistrados hondurenhos.
Como o mesmo já tinha sido aplicado ao décimo quinto membro do tribunal, aquele que redigiu a ordem de prisão de Zelaya, a iniciativa completou o assalto da senhora Clinton à independencia da suprema corte de uma democracia estrangeira.
A lição que fica é: os países pequenos estão obrigados a aceitar que os Estados Unidos da América sejam os interpretes das Leis locais. Pergunta-se porque isto acontece nos EUA, um país onde os princípios democráticos são reconhecidos desde a época dos fundadores. Muitos confessam estar "envergonhados" e perguntam o que fazer para ajudar Honduras. Talvez seja mais pertinente perguntar como ajudar os EUA.
No caso de Honduras, o governo Obama demonstrou seu desprezo pelos fundamentos da democracia. Os peritos em direito são claros a respeito. "A independência do poder judiciario é um componente central de qualquer democracia e é crucial para a separação de poderes, para o estado de direito e para os direitos humanos".(Aharon Barak, ex presidente da suprema corte de Israel em seu livro "The Judge in a Democracy").
É ainda A.Barak quem explica: "O propósito da separação de poderes é fortalecer a liberdade e prevenir a concentração de poder nas mãos de umgovernante, prejudicando as liberdades individuais", quase como se estivesse
referindo o caso de Honduras.
E ainda adverte profeticamente acerca das "democracias" como a de Chavez, que destruiu a Venezuela, exemplo que os hondurenhos estavam tratando de impedir em seu país: "A democracia tem o direito de defender-se contra os que buscam utilizá-la para destruir sua própria existência.
Os norte americanos devem perguntar-se por que seu governo parece não estar
de acordo.
Fonte: "El Diario Exterior"
Tradução: A. Montenegro
Faces do golpismo
ResponderExcluirHá duas atitudes aparentemente distintas perante o golpe de Estado hondurenho.
Uma destila o tradicional veneno antidemocrático, de retórica agressiva e valores distorcidos. Encontramo-la no udenismo renovado que aflorou no vácuo moral das classes médias urbanas. Para a vertente, Zelaya caiu porque mereceu, porque o “chavismo” deve ser combatido a porrete.
A outra face, enganadoramente inofensiva, escuda-se na apatia manhosa do pior provincianismo. Prefere a omissão do colonizado jeca, escancarando a banguela, tirando o chapéu para o painho estadunidense. Tem vergonha de ser brasileiro e defende que o país ocupe seu lugar na latrina do mundo subalterno. Convenientemente ignóbil, não “consegue” perceber que as próximas eleições hondurenhas vão justamente sacramentar o golpe, tornando-o irreversível e impune.
Ambas as posturas são complementares e indissociáveis. Mescladas nas diversas gradações combinatórias possíveis, constituem o estofo ideológico de todo movimento golpista: sempre há uma vanguarda atuante, apoiada na massa de manobra servil, que lhe garante a ilusão da legitimidade.
É importante entender esse mecanismo em funcionamento durante episódios externos e distantes, para reconhecê-lo quando operar em nosso próprio ambiente.